#FLAGvox | Das Grutas de Lascaux à Inteligência Artificial: Como chegámos aqui?

A viagem do Design, desde as primitivas representações nas grutas de Lascaux até ao uso avançado da Inteligência Artificial nos dias de hoje, é uma história sumarenta de evolução artística, tecnológica, política e filosófica. Este percurso reflete a capacidade humana de transformar ideias em expressões visuais que não só comunicam, mas também moldam o pensamento e a cultura da Humanidade.
As pinturas rupestres nas grutas de Lascaux, datadas com 17.000 anos de existência, representam alguns dos primeiros exemplos de Design e expressão artística. Estas imagens, que retratam animais e figuras humanas, não eram apenas manifestações criativas, mas também uma forma de comunicação e narrativa visual. Estes primeiros artistas usavam pigmentos naturais e técnicas rudimentares para capturar o mundo que os rodeava, dando início à fabulosa história do Design como uma ferramenta para contar histórias e registar a experiência humana.
Com o passar dos séculos, a Arte e o Design evoluíram em resposta às mudanças sociais, culturais e políticas. Durante o Renascimento, Leonardo da Vinci ou Michelangelo exploraram novas técnicas de perspetiva e anatomia, redefinindo o design como um estudo do mundo natural e da figura humana. Este período marcou o início de uma era onde a Arte e a Ciência começaram a convergir, lançando as bases para o Design moderno.
No entanto, foi com a Revolução Industrial, no século XVIII, que o Design começou a tomar uma forma mais definida como disciplina. A mecanização e a produção em massa criaram a necessidade de um design que fosse funcional e estético, ao mesmo tempo que atendesse às exigências da nova economia industrial. Este período viu o nascimento do Design Gráfico, com o desenvolvimento de novos tipos tipográficos, técnicas de impressão, e do design de produto, focado na criação de objetos utilitários que todos poderiam usar.
À medida que o século XX avançava, movimentos artísticos como o Modernismo, o Brutalismo e a Bauhaus revolucionaram o design ao defender a ideia de que “a forma segue a função”. Artistas e designers como Walter Gropius, Le Corbusier e Mies van der Rohe promoveram a simplicidade, a funcionalidade e a rejeição do ornamento excessivo, princípios que continuam a influenciar o design até hoje.
Com o advento do digital, o design entrou numa nova era. As décadas de 1980 e 1990 trouxeram o desenvolvimento de ferramentas digitais como o Adobe Photoshop e o Adobe Illustrator, que revolucionaram a forma como os designers criavam e manipulavam imagens. A transição do analógico para o digital permitiu uma maior precisão, flexibilidade e rapidez no processo de design, tornando possível a criação de gráficos complexos e layouts detalhados com facilidade.
Nas últimas décadas, a inteligência artificial (IA) emergiu como a próxima grande fronteira no Design. Ferramentas de IA, como geradores de arte e sistemas de design assistido, estão a redefinir o papel do designer. Algoritmos de machine learning podem agora analisar grandes volumes de dados e gerar designs personalizados que atendem às necessidades específicas dos utilizadores. Esta tecnologia não só aumenta a eficiência, mas também abre novas possibilidades criativas, permitindo a exploração de estilos e soluções que seriam impossíveis de alcançar de forma manual.
Um exemplo notável é o uso de redes neurais generativas (GANs) na criação de arte e design. Artistas e designers podem agora colaborar com máquinas para explorar novas estéticas e criar obras que misturam a criatividade humana com a capacidade computacional. No entanto, este avanço também levanta questões filosóficas e éticas sobre o papel do criador no processo de design e os limites entre a criatividade humana e a artificial.
Ao longo da história, o design também tem sido profundamente influenciado por correntes filosóficas e políticas. O movimento Arts and Crafts, liderado por William Morris no final do século XIX, surgiu como uma reação à industrialização desenfreada, defendendo a autenticidade, a qualidade artesanal e a integração da arte na vida quotidiana. Este movimento marcou o início de uma reflexão mais profunda sobre o impacto social e ético do Design, questões que continuam a ser relevantes hoje.
No século XX, o design tornou-se um campo de batalha para ideologias políticas. Na União Soviética, o Construtivismo usou o Design como uma ferramenta de propaganda, enquanto na Alemanha nazi, a estética do Design foi manipulada para promover a ideologia do regime. Estes exemplos mostram como o design pode ser usado tanto para inspirar como para oprimir, refletindo as tensões políticas e sociais da época.
Na atualidade, a sustentabilidade e a responsabilidade social emergem como os novos desafios do design. Designers como Victor Papanek, autor de “Design for the Real World” defendeu um design responsável e sustentável, permitindo inspirar gerações a repensar o impacto ambiental e social das suas criações. Hoje, o design sustentável não é apenas uma tendência, mas uma necessidade, com os designers a procurar soluções que minimizem o impacto ambiental e promovam a equidade social.
Desde as primeiras representações nas grutas de Lascaux até à inteligência artificial, a história do Design é uma narrativa de constante evolução, moldada por movimentos artísticos, avanços tecnológicos, e mudanças políticas e filosóficas. Cada etapa deste caminho fez com que o Design seja uma trave-mestra do desenvolvimento da Humanindade.
Mas nunca esquecer: o Design, em todas as suas formas, deve sempre servir as necessidades humanas.
A história do Design não é apenas uma timeline de estilos e técnicas, mas sim uma reflexão contínua sobre quem somos e o que queremos alcançar.
Artigo de opinião escrito por Eduardo Antunes.
Este artigo de opinião faz parte do eBook FLAG “Design em Perspetiva – As Múltiplas Facetas do Design” que reúne reflexões e ensaios de 14 profissionais que partilham as suas perspetivas sobre o papel do design na sociedade atual e futura.
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