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#FLAGvox | Designer, o super manipulador

Começar com este título faz-me sentir badass. O verdadeiro puppet master, génio da estratégia que mexe os cordelinhos para que os seus objetivos sejam atingidos. Um supervilão de BD que usa a manipulação como principal ferramenta para conquistar o mundo. Mas na verdade não é bem assim. E tal com “a Força” no Star Wars, a manipulação é um superpoder que tem um lado negro mas também um lado bom, e é nesse que o design(er) se deverá manter.

 

Uma peça de design invariavelmente desperta emoções e despoleta ações. Marcas bem pensadas e com identidades corretamente direcionadas ao seu público-alvo criam sensações de afinidade e alinhamento, resultando assim em relações potencialmente duradouras entre ambos. Um e-commerce bem desenhado dá-nos vontade de comprar o produto anunciado, sendo o resultado pretendido a sua compra. Uma campanha com um propósito ativista pode-nos fazer sentir solidário ou até mesmo “revoltado”, mas o objetivo final e ação esperada será a que nos juntemos ao movimento.

Com isto, vemos a força de influência que o design pode ter nestas formas de comunicação.

Mas como conseguimos a eficácia “do nosso design”?

Tudo se resume à experiência que as pessoas terão a interagir com o produto que estamos a desenvolver. Ter o foco de como vamos dirigi-las até lá, da forma mais simples e direta para si, será fundamental nas nossas tomadas de decisão ao longo do projeto.

Como tal, é preciso conhecer bem as pessoas que vão interagir com o resultado final do projeto que estamos a desenvolver, seja ele um site, uma marca ou um qualquer outro produto de design.

  • Que problema / necessidade as levará a utilizar o nosso produto,
  • Com que objetivos o farão,
  • De que forma as suas vidas poderão ficar melhor após essa interação.

 

Mas para além disso, devemos tentar perceber o máximo possível sobre elas. Muitas vezes dados não diretamente relacionados com o problema que estamos a tentar resolver podem dar-nos visões interessantes sobre as pessoas e interferir positivamente na solução.

Porque na verdade, o designer não cria experiências. Tenta sim dar pistas para que a pessoa que usa “o produto” crie por si essa experiência durante a interação.

As “guias” que o designer irá criar no produto para a sua utilização ou compreensão,  deverão ser completamente alinhadas com o perfil da pessoa-alvo, caso contrário, falhará. Por exemplo, um produto “simples” de usar, pensado para alguém com menos literacia digital, pode-se tornar demasiado simplista, pouco desafiante ou até ineficiente para alguém com mais destreza em plataformas digitais. Ou seja, cabe ao designer proporcionar condições para que a pessoa tenha a melhor experiência possível. Que lhe permita atingir os seus objetivos de interação da forma mais adequada possível – para si.

E é dessa manipulação que falo. A capacidade de perceber as pessoas para quem se desenha, interpretá-las e aos seus objetivos e projetar de que forma o poderão usar. E então, desenhar o produto para que elas o possam usar da forma mais eficaz possível. Que as leve “lá”, muitas vezes sem darem conta, mas que as faça sentirem-se realizadas por terem conseguido completar o seu objetivo.

Mas, como já dizia o tio do Peter Parker “com grande poder, vem grande responsabilidade”. E pode ser fácil cair na tentação de usar este super poder para influenciar as pessoas a fazer o que queremos – e na verdade, é parte da intenção. Mas devemos ter sempre a preocupação de usar este super poder do design “para o bem”. Em termos éticos, devemos ser responsáveis por ajudar as pessoas a atingir objetivos que, de alguma forma, contribuam positivamente para as suas vidas. Se queremos criar relações duradouras entre marcas e pessoas, precisamos garantir que essas relações sejam construídas em confiança e respeito mútuo.

Por exemplo, um site de e-commerce bem desenhado pode ser irresistível para um consumidor, mas se for construído com práticas desonestas, como dark patterns (padrões de design que enganam o utilizador), esse sucesso será de curta duração. Os dark patterns são como o lado negro da manipulação – ferramentas que podem levar a conversões no imediato, mas que corroem a confiança e a lealdade a longo prazo. Um exemplo clássico são os botões de “aceitar” e “recusar” cookies, onde o botão “aceitar” é propositadamente mais visível ou fácil de clicar. Isso pode até funcionar no imediato, mas as pessoas sairão dessa experiência com uma má imagem.

Então, como podemos manipular de maneira ética e positiva? 

Acima de tudo, desenhar com o foco em efetivamente querer resolver as necessidades das pessoas. Recorrer, por exemplo, ao storytelling com uma mensagem honesta e clara, para que no fim a marca ou produto possa ter um impacto positivo na vida das pessoas.

Num layout, criar hierarquias para as mensagens importantes. Usar elementos que chamem a atenção, como microinterações ou animações, para as informações ou ações que vão permitir à pessoa rapidamente fazer aquilo que precisa. Ou seja, direcionar a pessoa de uma forma sincera para que consiga cumprir os seus objetivos o melhor possível.

No fim de contas, nós designers somos, sim, manipuladores. Mas não uns quaisquer – somos aqueles que, em vez de controlar, preferem guiar de uma forma subtil, quase invisível. Usamos os nossos Jedi mind tricks  para resolver problemas e, com sorte, tornar o mundo um bocadinho melhor, uma experiência de cada vez. Somos aqueles que estão por trás de cada marca ou website a mexer os cordelinhos, com todo o cuidado e carinho.

Na verdade, o que queremos mesmo é que seja feliz, alcançando os seus objetivos – e, se tudo correr bem, ainda nos agradece por isso.

 

Artigo de opinião escrito por Emídio Vidal

Este artigo de opinião faz parte do eBook FLAG “Design em Perspetiva – As Múltiplas Facetas do Design” que reúne reflexões e ensaios de 14 profissionais que partilham as suas perspetivas sobre o papel do design na sociedade atual e futura.

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