#FLAGvox | Não, não fazemos só os bonecos!

Penso que é um sentimento comum a todos os designers, quando ouvimos a frase, agora é com vocês, “Os designers são os que fazem os bonecos!”
Bastante redutor certo?
Sabemos que nós designers, fazemos muito mais do que isso. Mas como mostrar o nosso valor? Não é fácil… mas é possível.
Quando fui convidada para criar uma equipa de design numa empresa orientada à engenharia, não sabia que estava a embarcar para uma jornada cheia de desafios, mas também de muitas aprendizagens e muitas conquistas.
O mundo de uma organização orientada à engenharia é dinâmico e competitivo e o design é frequentemente subestimado, considerado frequentemente como um toque final estético e sem importância estratégica. No entanto, nós sabemos que podemos dar muito mais..
Para mudarmos a forma como nos percecionam temos que primeiro entender que problemas temos de enfrentar. Seguem alguns exemplos de desafios que encontrei pelo caminho.
- Existe pouco investimento tanto financeiro como estratégico para promover o design e os recursos são mínimos e experimentais;
- A falta de investimento advém da pouca divulgação sobre o papel do designer e da pouca inclusão das atividades de design nos projetos;
- Falta de gestão de design ou agente representante do design na organização;
- Falta de comunicação entre as equipas e departamentos.
Como podemos contornas estes desafios? Não existe uma receita, mas existem alguns comportamentos ou iniciativas que podem ajudar a mudar a perceção do valor do design.
Primeiro passo é definir um responsável pelo design. Convenientemente alguém da área do design, alguém que já tem experiência em vários projetos de design e alguém que tem o gosto pela gestão de equipa. Essa pessoa será o gestor(a) da área de design e irá dar o corpo às balas pela sua equipa. Espera-se dessa pessoa:
- Criar os alicerces da equipa, missão, visão e objetivos;
- Construir uma o plano de carreira dos designers da sua equipa;
- Planear as atividades de design, distribuir e apoiar os projetos de design;
- Divulgar, estruturar e comunicar a área de design.
O gestor da área de design constrói os alicerces da equipa e garante a boa comunicação e continuação entre as equipas e departamentos. É a cara da equipa e deve ser a voz da mesma entre os departamentos da organização.
Falando em comunicação… A falta ou má comunicação entre o que é esperado de cada equipa ou departamento é muitas vezes uma barreira. Mas como qualquer problema, pode-se tornar numa oportunidade. Neste caso uma oportunidade para aumentar a visibilidade e valor desta área.
Será importante é criar as pontes entre as ilhas, ilhas estas que refiro como departamentos e equipas. Através da interação entre as equipas de engenheiros, gestores, gestores de conta, clientes e designers se poderá reduzir as diferenças e problemas de comunicação entre estas duas equipas. Conhecer as limitações, mas também os benefícios de todas as partes, ajuda a ter a noção das melhores formas de trabalhar em conjunto.
Apostar na divulgação dos projetos a decorrer da equipa de design e partilhar as conquistas da equipa, irão também ajudar a melhorar a comunicação. Ao criar uma maior visibilidade da equipa estaremos a:
- Aumentar a cultura do design internamente e externamente;
- Aumentar a maturidade do design internamente;
- Melhorar introdução das atividades de design nos projetos.
Todos os envolvidos e em contacto com os designers podem tornar-se aliados… mas existe um grupo na organização que poderão ser aliados preciosos. Os membros da organização que estão no topo da hierarquia poderão ser os principais propulsionadores da área, poderão fornecer recursos e os contactos certos para fazer arrancar a estrutura de design. Ter o apoio e reconhecimento do valor por parte desta equipa, irá acelerar o processo de criação e a boa sustentabilidade da equipa de design interna.
Os departamentos de Marketing e a própria equipa de vendas ou gestores de contas, podem ajudar também a expor o valor do design nos projetos alargando a toda a organização.
A apresentação de casos bem-sucedidos da equipa de design onde se exibe o benefício de integrar o design, tais como poupança de tempo de desenvolvimento, poupança de recursos, garantia de qualidade, visão geral dos requisitos e o seu contributo estratégico e de inovação serão um modo de conscientizar a organização pelo valor do design.
Mas nem tudo se baseia só numa boa comunicação ou competências de diálogo entre equipas…
Tudo o que é gerido deve ser medido, logo o design ou o impacto do design nos projetos deve ser medido também. Partilhar números, KPI’s do impacto do design na organização irá ser um bom condutor e valorizador do design.
A obtenção de métricas vai proporcionar à equipa de design expor através de números o impacto da sua participação nos projetos. Medir a o retorno de investimento do design, medir a performance, medir a satisfação dos clientes ou utilizadores soará música nos ouvidos na gestão de topo da organização.
Documentar meticulosamente cada etapa do processo de design também ajudará a percecionar o valor e impacto do design. Criar relatórios detalhados que explicam o raciocínio por trás das escolhas de design, fornecer a visão clara e fundamentada do trabalho realizado ajuda no processo. A documentação não apenas clarifica as decisões da equipa de design, mas também mostra a profundidade e a importância do design estratégico.
O meu esforço como promotora do design na empresa teve vários resultados, tais como: a equipa de design passou a ser solicitada mais vezes para participar em mais projetos importantes iniciando-se logo no início do projeto e não só no fim. O design ganhou mais integração como um elemento estratégico do desenvolvimento de produtos. Mais presenças em propostas comerciais em clientes e participação em workshops para geração de novas ideias. A equipa de design começou a crescer rapidamente e os clientes ficaram também mais satisfeitos com os seus produtos.
O design passou a ser mais valorizado e integrado em todas as fases do desenvolvimento dos projetos e serviços, através de persistência na gestão, comunicação e medição do design.
Em suma, o design pode ser um elemento transformador em qualquer organização, desde que seja devidamente compreendido e valorizado. O valor aumenta se existir um nível de cooperação alto entre as várias equipas nos projetos.
É nesse processo de envolvência que os stakeholders presentes nos projetos tomam a consciência dos benefícios e vantagens de trabalhar com uma equipa de design. Quanto maior é a cooperação e inclusão da equipa de design no desenvolvimento de produtos e serviços, maior é a sua expansão dentro da organização. Esse crescimento, permitirá a possibilidade de implementar os processos e métodos mais comuns do design, como por exemplo o Design Thinking pelos vários projetos da organização.
Portanto, da próxima vez que alguém disser que só fazemos “desenhos”, vejam isso como uma oportunidade para mudar a perceção dos outros sobre o nosso trabalho como designers.
Artigo de opinião escrito por Kátia Marques.
Este artigo de opinião faz parte do eBook FLAG “Design em Perspetiva – As Múltiplas Facetas do Design” que reúne reflexões e ensaios de 14 profissionais que partilham as suas perspetivas sobre o papel do design na sociedade atual e futura.
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